Baldi, Mario (Salzburg - )

Vida: 
1896 a 1957
País: 
Áustria
Autor: 
Marcos Felipe de Brum Lopes
Campo de atuação: 
Fotografia documental
Fotografia etnográfica
Fotojornalismo
Trajetória fotográfica: 
Liga Austro-Húngara (Primeira Guerra Mundial)
D. Pedro de Orleans e Bragança (neto de D. Pedro II)
Museu de História Natural de Salzburg (Áustria)
Missão Salesiana no Brasil (Mato Grosso)
Jornal A Noite (Rio de Janeiro)
Ministério de Educação e Saúde (Era Vargas)
Serviço de Proteção ao Índio (SPI)
Força Aérea Brasileira (FAB)
Fundação Brasil Central (FBC)
Destaques: 
Filme e fotografias da missão salesiana entre os índios Bororo de Mato Grosso (1934-35)
Cobertura fotográfica para A Noite de expedições ao interior do Brasil, vinculado ao Serviço de Proteção ao Índio (SPI) e Fundação Brasil Central (FBC)
Fotógrafo contratado para a “Obra Getuliana”, projeto comemorativo do governo de Getúlio Vargas idealizado por Gustavo Capanema
Livros “Uoni-Uoni conta sua história” (São Paulo: Melhoramentos, 1950) e “Uoni-Uoni oder die letzten Indianer am großen Wasser” (Düsseldorf: Bastion-Verlag, 1952)
Fotografia do filme “Il segreto della Sierra Dorada”, de Pino Belli (Itália, 1956)

 

Mario Joseph Anton Johann Baldi, mais conhecido como Mario Baldi ou apenas Baldi, nasceu em 18 de janeiro de 1896, na cidade austríaca de Salzburg, Europa. Filho do comerciante Alois Baldi e Louisa Baldi, vinha de uma família de artistas e comerciantes, emigrada da Itália para a Áustria em meados do século XIX. Gregor Baldi, irmão do bisavô de Mario, possuia uma galeria de arte e o maior estúdio fotográfico da Áustria Oitocentista, o Baldis Photographische Anstalt, rebatizado mais tarde de Baldi & Würthle, após a sociedade com o químico germânico Friedrich Würthle.

Mario Baldi estudou no seminário St. Paul in Kärnten, uma instituição educacional dos Monges Beneditinos em Lavanttal, sul da Áustria. Em 1914, finalizou o Gymnasium[1], curso no qual já se interessava por história, geografia e etnologia, temas que marcariam sua atuação fotográfica futura.

Os primeiros contatos de Mario Baldi com a prática fotográfica ocorreram na I Guerra Mundial (1914-1918), quando lutou nas fileiras da liga Áustro-Húngara como reconhecedor de campo e produziu fotografias das regiões da galícia, russas e turcas pelas quais passou. No contexto europeu desfavorável do pós-guerra, o jovem austríaco deixou seu país em direção ao Brasil com seu irmão mais novo, Herbert, e desembarcou do vapor Poconé no porto do Rio de Janeiro em março de 1921.

A primeira fase da trajetória fotográfica de Baldi no Brasil começou ainda no ano de chegada ao novo país. Entre 1921 e 1924, percorreu cidade e Estado do Rio de Janeiro, como fotógrafo itinerante. Neste período, Mario Baldi também escreveu matérias jornalísticas sobre suas passagens pela Baixada Fluminense e a Região Serrana do Rio de Janeiro, as quais enviava para a imprensa austríaca, especialmente para o Salzburger Volksblatt, o jornal de sua cidade natal.

Na segunda metade da década de 1920, Baldi trabalhou na casa imperial em Petrópolis[2], onde conheceu o neto de D. Pedro II, o príncipe D. Pedro de Orleans e Bragança. De empregado, Baldi passou a secretário e fotógrafo particular de D. Pedro e o acompanhou em viagens por todo o Brasil. As imagens produzidas nesse contexto foram aos poucos chegando à imprensa ilustrada brasileira. O fotógrafo retornou à Europa com D. Pedro em 1928 e lá realizou palestras ilustradas com diapositivos sobre suas experiências no Brasil, bem como publicou artigos na imprensa ilustrada europeia.

Em 1932 Baldi visitou o norte da África acompanhando uma expedição do Museu de História Natural de Salzburg e lá produziu séries fotográficas que cobrem as regiões colonizadas pela Itália.

O período era, entretanto, bastante desfavorável para Baldi. A depressão econômica, os altos índices de desemprego e a instabilidade política aumentavam seu desejo de retornar ao Brasil, o que só conseguiu com muitas dificuldades, graças aos padres salesianos que o contrataram para produzir um filme sobre a missão religiosa no Mato Grosso. Um desses padres já era conhecido de Baldi e D. Pedro desde os anos 1920.

Definitivamente no Brasil a partir de 1934, Mario Baldi estreitou seus vínculos com a imprensa e, em 1938, foi contratado para o corpo jornalístico da empresa A Noite, no Rio de Janeiro. Cobriu no mesmo ano as filmagens da cineasta Doralice Avellar entre os índios Carajá. Baldi aproximava-se cada vez mais da fotografia etnográfica, o que lhe era facilitado pela vinculação de fotojornalistas às inciativas colonizadoras dos Serviços de Proteção ao Índio. Nesse contexto destaca-se seu trabalho com Lincoln de Souza, jornalista também interessado nas questões étnicas e de diversidade cultural do Brasil. Com ele Baldi compôs uma dobradinha repórter-fotógrafo que assinou algumas matérias sobre as incursões das “missões pacificadoras” em territórios indígenas.

Em 1940, viajou pelos Estados do norte brasileiro como fotógrafo enviado pelo Ministério de Educação e Saúde. O propósito da viagem era produzir fotografias para uma publicação de fôlego sobre os 10 anos do governo de Getúlio Vargas, idealizada pelo ministro Gustavo Capanema e denominada “A Obra Getuliana”.

No ano de 1947, Baldi e sua esposa Emmy, com quem havia se casado em sua última passagem pela Europa, mudaram-se para Teresópolis, na região serrana do Rio de Janeiro. Na residência do casal, que também funcionava como uma pensão que Emmy administrava, Baldi montou seu laboratório e passou também a prestar seus serviços fotográficos à sociedade teresopolitana, através de fotografia de formaturas e eventos políticos. Lá participou dos festivais culturais da Pró-Arte como fotógrafo e professor de fotografia.

Em 1950, o fotógrafo publicou seu livro “Uoni-Uoni conta sua história”, uma obra que retoma algumas experiências do autor junto aos índios Carajá nos anos 1930 e 1940. Com uma versão alemã de 1952, “Uoni-Uoni” é uma composição de texto e imagem narrada por uma criança indígena.

Nos anos 1950, Baldi já não tinha vínculos oficiais com a imprensa (havia deixado o jornal A Noite e se transferido para os Diários Associados em 1949, porém permaneceu ali pouco tempo). Entretanto, continuou a publicar seus materiais em revistas como Manchete e outras europeias com as quais ainda mantinha contato. Casou-se pela segunda vez em 1955 com a holandesa Ruth Yvonne Fimmen (Emmy Baldi morrera vítima de câncer em 1953). Ao lado de Ruth, Mario Baldi fez outras viagens ao interior do Brasil e, em 1956, fez a fotografia do filme Il segreto della Sierra Dorada, do diretor italiano Pino Belli, que se passa entre índios brasileiros.

Em 1957, numa trágica viagem à região dos índios Tapirapé em Mato Grosso, Ruth foi morta por uma picada de cobra e, na tarde do mesmo dia, Mario Baldi sofreu um ataque cardíaco, vindo a falecer. Ambos foram enterrados na aldeia. Em 1961, uma fotografia da sepultura do casal foi feita pelo amigo Rubens Stückenbruck. É esse o último registro fotográfico da trajetória do fotógrafo austro-brasileiro Mario Baldi.

História e situação atual da Coleção Mario Baldi

Durante os anos de 1954 e 1956, Etta Becker-Donner, então diretora do Museu de Etnologia de Viena, visitou o Brasil a fim de fazer trabalhos de campo etnográficos, linguísticos e arqueológicos no Território Rondônia. Na ocasião, conheceu o fotógrafo Mario Baldi, de quem adquiriu 30 fotografias produzidas entre os Bororo, Carajá e Tapirapé. Quando Etta Becker-Donner retornou a Viena, levou para lá a primeira fração da produção de Baldi. Em 1959, dois anos depois do trágico falecimento do fotógrafo entre os Tapirapé, o museu vienense recebeu parte de sua herança, composta por um acervo de 386 objetos etnográficos carajá e o que parecia ser seu arquivo fotográfico: quatorze caixas contendo ampliações ordenadas tematicamente, folhas-contato organizadas em cartões, mais de dez mil negativos e uma quantidade pequena de diapositivos. Apesar das inscrições esporádicas no verso das ampliações, o acervo não dispunha de informações documentais escritas, o que fez com que fosse catalogado de maneira primária, ainda que o seu valor e interesse tenham sido prontamente reconhecidos.

Passados quase 30 anos e sem o conhecimento do museu vienense, no fim dos anos 1980 o Serviço do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (SPHAC) da Secretaria de Cultura da Prefeitura de Teresópolis recebeu, do escritor e médico Arthur Dalmasso (1920–2006), a outra parte da herança de Mario Baldi. A doação de Dalmasso incluía não só ampliações fotográficas e folhas-contato, mas também artigos ilustrados, cartas e demais documentos pessoais referindo-se ao fotógrafo e suas atividades.

Foi apenas entre 2006 e 2008 que tanto Teresópolis como Viena efetivamente descobriram que guardavam as duas metades de um tesouro austro-brasileiro, o qual possibilitaria conceder a Mario Baldi seu merecido lugar na história da fotografia brasileira. Uma exposição foi realizada em 2009 como parte do Foto Rio daquele ano e contou com 30 fotografias de cada instituição.

Atualmente, as duas partes da Coleção Mario Baldi estão abertas à pesquisa. Os filmes produzidos por Baldi, infelizmente, ainda não puderam ser encontrados.

 

 

[1] Fase escolar que antecede a Universidade, nos países germânicos

[2] Cidade serrana do Estado do Rio de Janeiro

 

Referências: 
LOPES, Marcos F. de Brum. 2010. Mario Baldi: experiências fotográficas e a trajetória do “repórter perfeito” – (1896-1957). Dissertação de mestrado. Niterói: UFF.
LOPES, Marcos F. de Brum e FEEST, Christian. 2009. Mario Baldi: fotógrafo austríaco entre índios brasileiros. Rio de Janeiro: F.DUMAS História e Ciências Sociais.

 

 

ISBN: 978-85-63735-10-2