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Acervo Trajetórias Docentes

Entrevistado: Caroline Pereira Barros Araújo
Entrevistador: Memorial - PIBID
Tipo: história de vida
Duração:
Local:
Data: 11/01/2017
Sumário

Caroline Pereira Barros Araujo foi bolsista do Pibid no Subprojeto História UFF 2014 (Entrega do memorial – 11/2017)

 

Sou Caroline Pereira Barros Araujo, graduanda do curso de História pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e este memorial objetiva discorrer acerca da trajetória desenvolvida por mim, em parceria com meus colegas licenciandos, além da minha supervisora1, e do meu coordenador2, nos quatro anos em que fiz parte do PIBID – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência.

 

  1. Formação:

Prestar vestibular para entrar na Universidade sempre esteve nos meus planos. Minha grande questão era: qual faculdade cursar afinal? Meu interesse pelas disciplinas da área de Humanas estava claro para mim desde o Ensino Fundamental. A facilidade que eu tinha com estas matérias me encaminhou para pensar quais carreiras que giravam em torno delas eu poderia escolher para minha vida. Mas foi só enquanto eu cursava o terceiro ano do Ensino Médio, numa palestra durante uma excursão à Universidade Federal do Rio de Janeiro, que eu decidi estudar História.

História já era minha matéria preferida na escola, mas naquela palestra eu percebi o quanto eu poderia aprender cursando História e isto me encantou. “Quanto conhecimento eu poderei ter acesso” – eu imaginava. E certa estava. Só não sabia o quanto. Realmente a faculdade de História nos proporciona um aprendizado inquestionável. O ambiente de constantes debates e discussões, dentro e fora de sala de aula, impulsiona e incentiva o querer aprender sempre mais. Não que se possa aprender ou conhecer a totalidade das coisas – coisa esta que sim, todos deveriam apreender.

Outra coisa que todos e todas deveriam apreender, é que o aprendizado é construído através da troca entre educador (a) e educando (a). E isto eu pude compreender, de fato, no PIBID. Compreender como tal troca é fundamental e necessária para formação tanto do educador (a) quanto do (a) educando (a) só é possível na prática. E eu tive esta oportunidade com o PIBID. Quando entrei na faculdade de História já sabia que queria ser professora, mas fazer parte do PIBID me proporcionou a chance de iniciar este eterno aprendizado que é educar.

Nas palavras de Freire:

É preciso que, pelo contrário, desde os começos do processo, vá ficando cada vez mais claro que, embora diferentes entre si, quem forma se forma e reforma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado. É neste sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos, nem formar é ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência, as suas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. (Paulo Freire, Pedagogia da Autonomia, p. 25, grifos meus).

 

2. Projeto Político Pedagógico:

Este aprendizado não teria sido tão enriquecedor sem a orientação e a supervisão da professora Priscila Artte Nascimento. Como defende Freire, Priscila não só transfere conhecimento e conteúdo aos seus educandos, mas os percebe enquanto sujeitos, dotados de seus próprios conhecimentos, e se empenha em colocar em prática a troca necessária ao aprendizado para a formação de cidadãos. Isto porque, Priscila, assim como Freire – e aqui me incluo também – acredita que a educação é transformadora.

Esta noção é cara para aqueles que não consideram a educação um projeto mercadológico, em que o ensino é tratado como mercadoria e os alunos como produtos. Educar não é tecnicizar um aluno para o mercado de trabalho, educar é um processo de aprendizado crítico e mútuo, no qual educando e educador se tornam capazes de aprender e de pensar criticamente, de aprender a pensar criticamente, construindo novos conhecimentos. A experiência vai se dar de forma diversa para cada um dos sujeitos deste processo, mas ela deve fazer sentido para ambos. Pois, (…) “nas condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo. Só assim podemos falar realmente de saber ensinado, em que o objeto ensinado é apreendido na sua razão de ser e, portanto, aprendido pelos educandos3.

Assim, o que é ensinado deve remeter àquilo que faz sentido na vida do educando, de forma que seja possível a reflexão e a troca que levam à apreensão do conhecimento. Por isso, o que é ensinado não pode estar descolado da realidade social em que vivemos.

Como se percebe ainda em Freire:

Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a violência é a constante e a convivência das pessoas é muito maior com a morte do que com a vida? Por que não estabelecer uma “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos? Por que não discutir as implicações políticas e ideológicas de um tal descaso dos dominantes pelas áreas pobres da cidade? A ética de classe embutida neste descaso? “Porque, dirá um educador reacionariamente pragmático, a escola não tem nada que ver com isso. A escola não é partido. Ela tem que ensinar os conteúdos, transferi-los aos alunos. Aprendidos, estes operam por si mesmos. (Freire, p. 32, grifos meus)

 

As palavras de Freire, em 1996, parecem prever a fala daqueles que defendem o “Escola sem Partido”, projeto que ameaça a autonomia dos (as) professores (as) nos dias de hoje. Na verdade, revelam que este discurso conservador já está imerso em nossa sociedade há décadas. O ensino, aqui, se restringe a um programa conteudista, partindo de uma fórmula empírica positivista, que desconsidera a relação entre conhecimento e vivência, entre a escola e o mundo exterior a ela, entre o educando e o educador. Neste sentido, a própria defesa de uma “escola sem partido” é partidária, pois serve à ideologia dominante, a mesma que trata a Educação como uma fábrica de mão de obra barata.

A necessidade de agir contra este ataque é urgente! A escola deve ser um ambiente democrático e livre, onde todos e todas possam discutir e refletir acerca dos diferentes temas que permeiam a realidade social em que vivemos, da qual a escola faz parte. Professores e professoras não podem se eximir dos debates que já estão colocados em sala de aula. A discriminação, a homofobia, o machismo, o racismo, as violências e os preconceitos, se encontram disseminados em nossa sociedade, logo também estão na escola. Portanto, é preciso que os (as) professores (as) não só tenham a autonomia e a liberdade para trabalhar estes temas, como também estejam preparados para isto.

Aprender que a luta é condição sine qua non do exercício do docente é essencial para os que defendem uma educação libertadora. Ensinar e lutar caminham juntos nesta jornada: “A luta dos professores em defesa de seus direitos e de sua dignidade deve ser entendida como um momento importante de sua prática docente, enquanto prática ética. Não é algo que vem de fora da atividade docente, mas algo que dela faz parte4.

 

3. PIBID

Baseado nesta linha tem sido o meu exercício na prática docente através do PIBID. Buscando pensar e planejar atividades e projetos que relacionem a História à realidade social, de forma que o sentido deste conhecimento seja demonstrado para os educandos, possibilitando desta maneira a construção um novo saber. Aqui, a experiência e o posicionamento da professora Priscila são determinantes e de grande apoio para mim. Aprendi e apreendi muitos saberes com esta pessoa e profissional incrível e única, e hoje nossa proposta se encontra em nossa prática.

Assim, as atividades e os projetos que foram planejados e postos em prática pelo nosso grupo em conjunto partiam das demandas que eram percebidas em sala de aula, e nosso trabalho se apresenta no preparo de material didático alternativo, através do qual as diferentes questões são abordadas de maneira que os educandos se identifiquem com elas, motivando o aprendizado coletivo.

Dentre os diversos projetos que organizamos nesses quatro anos em que fiz parte do PIBID, e não foram poucos – Roda de Leitura, Oficina dos Conceitos, Cine-Pipoca, entre outros –, um em particular representa perfeitamente a troca fundamental ao aprendizado, pois me identifico especialmente com a temática: Mulheres na História. Neste projeto, trabalhamos os papéis desempenhados pelas mulheres nos diferentes períodos históricos, com o objetivo de desconstruir o imaginário que desqualifica as mulheres, colocando-as em segundo plano, quando não mesmo as exclui da História.

O silenciamento das mulheres em nossa sociedade se reflete na historiografia e nos livros didáticos, de modo que abordar questões referentes às mulheres é uma demanda que não pode ser negligenciada. Por isso me dedico a este estudo, como o fiz em minha monografia, e me comprometo a esta prática, como o fiz neste projeto. Para mim, as oficinas das Mulheres na História materializam a troca que constrói aprendizado e saber.

O PIBID simboliza a junção entre o que eu imaginava quando decidi cursar a faculdade de História e o que eu pude apreender na minha formação como professora de História: acesso ao conhecimento que me permitiu construir um novo saber.

A formação de professores (as) é uma tarefa que precisa ser tratada com responsabilidade e, para tanto, é preciso de incentivos como o PIBID. O investimento no Ensino Superior se reflete, assim, na Educação Básica. A continuidade do PIBID é, portanto, primordial para formação qualitativa de educadores (as) e de educandos (as). Defender sua permanência enquanto política pública faz parte da luta que constitui a prática docente.

Deixo o PIBID com agradecimentos aos colegas que partilharam comigo estes anos de aprendizado e de trabalho, ao professor Everardo por todo seu apoio e carinho durante esta jornada, e, especialmente, a professora Priscila, pelo seu afeto, pela sua experiência, pelo seu saber, pela pessoa que é você.

Encerro meu memorial, que traduz o que foi um grande aprendizado em uma profunda experiência, com as palavras e os saberes de Paulo Freire, que atravessaram e marcaram a minha formação acadêmica e profissional, e que, através da História e do PIBID/UFF, pude aprender e apreender: “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo”. É nisto que acredito, é por isto a minha luta.

1Priscila Artte do Nascimento, professora da Educação Básica no Colégio Aurelino Leal em Niterói.

2Everardo Paiva de Andrade, professor da Universidade Federal Fluminense.

3FREIRE, Paulo.: “Pedagogia da Autonomia – saberes necessários à prática educativa”, p. 28

4Idem, p. 65

 

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