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Acervo Trajetórias Docentes

Entrevistado: Flavia dos Santos Cordeiro Pereira
Entrevistador: Memorial - PIBID
Tipo: história de vida
Duração:
Local:
Data: 11/01/2017
Sumário

Flavia dos Santos Cordeiro Pereira foi bolsista do Pibid no Subprojeto História UFF – 2014 (Entrega do memorial – 11/2017)

Memorial PIBID/ História

 

Ingressei no Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID no ano de 2014, após um processo seletivo que já aguardava há algum tempo. Observava as atividades de outro colega da área de História em minha escola, recebia os seus licenciandos em minhas aulas e aguardava o momento em que também poderia participar dessa transformação na formação de novos profissionais e na minha própria relação com o processo de ensino-aprendizagem.

Resumidamente, minha trajetória até o ingresso no Programa iniciou-se em instituições púbicas do Rio de Janeiro. Primeiramente, na Escola Municipal República do Peru, localizada no bairro do Méier, na cidade do Rio de Janeiro, onde cursei do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental. Concluída esta etapa, ingressei no Colégio Pedro II, onde cursei o Ensino Médio no Campus São Cristóvão I. Terminado o Ensino Médio, prestei vestibular para instituições como a Universidade Federal Fluminense (UFF), para a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e para a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sendo aprovada em todas as instituições citadas e optando pela última para cursar o Bacharelado e a Licenciatura Plena em História.

Já no terceiro período do curso de História, após um processo seletivo, tive a oportunidade de ingressar, como bolsista de Iniciação Científica, no Programa de Estudos Americanos (PEA), sob a coordenação das professoras doutoras Eliane Garcindo de Sá e Francisca Lúcia Nogueira de Azevedo e do professor doutor Lincoln de Abreu Penna e da professora doutora Vera Lúcia Cabana Queiroz Andrade (colaboradores).

Foi uma experiência bastante enriquecedora, pois, a partir do momento em que ingressei no PEA através do projeto Levantamento do Acervo Documental e Bibliográfico referente à América Hispânica Encontrado em Bibliotecas do Rio de Janeiro1, pude efetivamente iniciar o meu contato com fontes diversas e desenvolver uma série de trabalhos que foram apresentados nas Jornadas de Iniciação Científica.

. Atuei no processo de identificação da documentação relacionada à América Espanhola encontrada na cidade do Rio de Janeiro. O levantamento dessas fontes ocorreu em instituições como o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), o Real Gabinete Português de Leitura, a Biblioteca Euclides da Cunha, a Academia Brasileira de Letras, a Fundação Getúlio Vargas, a Biblioteca Nacional e a Biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais das UFRJ.

Os primeiros resultados do projeto vieram com a publicação do catálogo “A Conquista do Novo Mundo: Fontes Documentais e Bibliográficas Relativas à América Hispânica” (1991) e da antologia “A Conquista da América Espanhola” (1991)2. O objetivo básico do catálogo era auxiliar o historiador, facilitando, o máximo possível, sua consulta ao arquivo. Já as antologias, visavam à divulgação e ao tratamento de fontes históricas. Através da apresentação da documentação, selecionada de forma temática, os docentes, tanto do ensino universitário, como os vinculados ao Ensino Fundamental e Médio, poderiam tratar de um episódio histórico através de fontes primárias, permitindo ao aluno contato direto com a documentação histórica.

Cabe ressaltar que tais atividades foram realizadas numa época em que não dispúnhamos de acervos digitalizados e de consultas a publicações na internet com a facilidade dos tempos atuais. Daí a sua relevância.

Permaneci no projeto até o ano de 1997, quando me formei. Em 1998 ingressei na Rede Estadual de Educação do Rio de Janeiro, no Colégio Estadual Raul Vidal (CERV), na cidade de Niterói.

Nesses dezenove anos, além de atuar no CERV como professora de História, em função das mazelas que educação vem sofrendo ao longo dos anos, também ministrei aulas de Geografia, de Filosofia e de Sociologia, a fim de suprir a carência de profissionais destas disciplinas.

Também, em função da carência de professores de História, atuei nos colégios Visconde de Cairu (na cidade do Rio de Janeiro, 2001) e Melchíades Picanço (na cidade de São Gonçalo, 2003-2004).

Em 2006 ingressei novamente na Rede Estadual de Educação do Rio de Janeiro com uma segunda matrícula, também no Colégio Estadual Raul Vidal. Permaneci atuando nesta segunda matrícula até o ano de 2011, quando fui aprovada e convocada para atuar na Rede Municipal do Rio de Janeiro.

Na Rede Municipal do Rio de Janeiro, iniciei a carreira na Escola Municipal Oswaldo Cruz (situada no bairro de Higienópolis), atuando em turmas do 6º ao 9º ano. Permaneci nesta escola até o ano de 2013, quando por uma decisão da Secretaria Municipal de Educação (SME), a direção e o corpo docente foram informados de que apenas o primeiro segmento do Ensino Fundamental seria oferecido naquela U.E.

Assim, no ano de 2014 fui alocada na Escola Municipal Benevenuta Ribeiro (no bairro do Méier). Porém, como não havia total disponibilidade de horários na U.E., tive que completar a carga horária em outra unidade, a Escola Municipal Olavo Josino de Salles (em Inhaúma).

Solucionada a questão da disponibilidade de horários, desde o ano de 2015 atuo apenas na Escola Municipal Benevenuta Ribeiro.

Em paralelo à vida profissional nas Redes Estadual e Municipal de Educação do Rio de Janeiro, também frequentei o Curso de Idiomas CLC (que era oferecido na UERJ), participei de cursos de atualização profissional promovidos pela SEEDUC/RJ em parceria com a Fundação CECIERJ e com a UFRJ e, atualmente estou cursando uma pós graduação em História do Brasil Contemporâneo na Universidade Estácio de Sá (Unidade Madureira).

 

I - Motivações e Intenções: o ingresso no PIBID

 

O PIBID é um importante elo entre a universidade e as escolas públicas de educação básica. Permite novas reflexões a respeito do ensino e da educação, como um todo, além de proporcionar uma maior proximidade entre alunos, professores e licenciandos. Auxilia no processo de formação de novos profissionais, na formação continuada de professores da Rede Estadual e na interação escola-universidade.

Há tempos já vinha insatisfeita com a minha própria prática docente. O fato de estar distante do meio acadêmico, das produções e discussões mais recentes, de novos desafios, além das próprias dificuldades enfrentadas pelos profissionais que atuam nas redes públicas de ensino em nosso país, faziam com que eu não sentisse mais o prazer e a motivação do início da carreira.

Observando o trabalho de colegas de outras disciplinas e de um colega de História no CE Raul Vidal, vinculados ao PIBID, senti-me motivada a uma guinada na minha vida profissional. Chegara o momento de sair da zona de conforto e lançar-me ao novo.

A partir do momento em que os licenciandos chegaram, que se iniciaram as reuniões e as atividades, com as rodas de leituras e debates na escola, as atividades propostas pela Coordenação, a Mostras de Iniciação à Docência e a Semana Acadêmica, percebi que essa era a oportunidade de reiniciar a minha trajetória e dar um salto de qualidade em minha prática. Era o momento de me reinventar enquanto profissional da educação. Redefinir o Ser professora.

E este processo teve início com a desconstrução da ideia de que ao professor cabia o Saber. Ao professor cabia o protagonismo no processo de ensino-aprendizagem.

E este é um dos aspectos altamente positivos do PIBID. Sou fruto de uma geração de profissionais que foi “treinada” para transmitir conteúdo aos alunos e não para construir o conhecimento com eles. Fazia-se necessário desconstruir a hierarquia professor-aluno.

Tendo como referencial teórico (TARDIF, 2002) e a importância que o mesmo dá para o saber experiencial, “incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de saber-fazer e de saber ser” (p. 38), me redefini enquanto professora e pude repensar todo o processo.

Não há um protagonista nessa relação. Todos os participantes (alunos-professores-licenciandos; escola-universidade) se complementam e colaboram entre si para que o processo aconteça. E este foi o ponto de partida.

 

 

II - Atividades desenvolvidas no PIBID

 

Partindo do princípio de que a oferta de conteúdo pura e simples não era o mais relevante em todo o processo, procurei centrar a minha prática pedagógica, juntamente com os licenciandos, em questões que perpassam o processo histórico e que fazem referência direta ao nosso dia a dia. Ao cotidiano de todos os envolvidos nesse trabalho.

Assim, as questões étnico raciais, a ampliação do ingresso de jovens provenientes de camadas populares nas universidades e o papel da escola na sociedade atual foram amplamente discutidos em oficinas, rodas de debate, passeios, sessões de cinema, culminando na produção de artigos e material pedagógico apresentado na UFF (Seminários, Semana Acadêmica e MID) e em sala de aula3.

E o que pude observar foi a melhora considerável na interação com os alunos. O interesse pelas aulas aumentou e, por consequência, também melhoraram os resultados obtidos nas avaliações e no percentual de aprovações na disciplina.

Como o programa vem se consolidando no CERV desde 2014, pude observar de forma cristalina o aumento do empoderamento e da propriedade da fala dos nossos alunos, partindo das reflexões que eles próprios realizam a respeito das opressões como um todo.

A cada ano observo a construção e a consolidação do diálogo democrático, ético e respeitoso, com o confronto de ideias e não os ataques pessoais que sempre foram mediados e ampliados com a nossa ajuda. Abriu-se o espaço para discussões acaloradas e fora do senso comum, onde certos "achismos" vêm sendo esclarecidos, aliando dessa forma a teoria e a prática.

A escola está se transformando num espaço de discussão. Através das atividades que propomos, os alunos podem perceber que todos somos produtores/construtores do conhecimento histórico e agentes transformadores da nossa realidade.

 

III - Relação Escola/Universidade no PIBID

 

Através do PIBID, a escola pública brasileira e a universidade se aproximam e traçam estratégias para a melhoria do processo ensino-aprendizagem e da relação professor-aluno, baseada numa realidade concreta e nos seus desafios.

A chegada do PIBID nas escolas coincidiu com o momento de expansão do ensino nas universidades públicas, com a entrada de mais jovens de classes populares no meio acadêmico. Isto acabou se refletindo em novas formas de se pensar a escola e novas formas de pensar o processo de ensino-aprendizagem e a relação professor-aluno. Proporcionou a diversidade de opiniões e debates enriquecedores.

A Universidade vem cumprindo seu papel nesse processo, formando novos professores e ampliando oportunidades para que docentes em formação tenham contato com a sala de aula, compreendendo o que é ser um Educador. Proporciona aos professores mais experientes e aos que estão em processo de formação, a percepção de que Ensinar não é meramente transmitir conteúdo ou ensinar a pensar, é acima de tudo mediar novas redes de conhecimento para que todos possam cooperar e crescer juntos.

Nesse sentido, as leituras que fizemos, sobretudo de TARDIF (2002) e NÓVOA (2011), aliadas à prática em sala de aula, geraram discussões que culminaram na formação de grupos de trabalho e na elaboração de artigos, atividades culturais e materiais didáticos relacionados às atividades do PIBID.

No ano de 2015, os licenciandos Rômulo Assis e Marina Araújo elaboraram um curta sobre Samora Machel e sua ideologia marxista-leninista4. O material foi elaborado a partir de questionamentos propostos pelos nossos alunos acerca do protagonismo negro no contexto dos conflitos ocorridos no período da Guerra Fria e teve como desdobramentos um seminário apresentado na UFF e uma apresentação na Semana Acadêmica de 2015.

Juntamente com os licenciandos Klauder Vicente Quevedo Gonzaga (2014-2017), Marina Araújo Rocha (2014-2016), Raphael Braga (2015-2017), Rômulo Fernandes (2014-2016) e Sulyanne Marques Assis (2014-2016) foram elaborados artigos publicados na obra organizada pelo PIBID de História da UFF, sob o título Universidade e escola formando professores de História, em 2015.5

Após a apresentação de nossos trabalhos na III Mostra de Iniciação à Docência e na Semana Acadêmica de 2015, também elaboramos artigos que constam do relatório final encaminhado à CAPES no ano de 2016 e que são relatos e reflexões acerca da trajetória do PIBID no Colégio Estadual Raul Vidal desde 2014.6

Além dos artigos construídos conjuntamente com os licenciandos, também houve a produção de um trabalho elaborado pelas Professoras Supervisoras Flavia dos S. C. Pereira, Ana Margaret de C. F. Vale e Eleonora Abad Stefenson, sob a Coordenação do Prof. Marcus Dezemone, com vistas à publicação de um novo livro elaborado pelo conjunto do PIBID/HISTÓRIA/UFF, sob o título Reflexões sobre as transformações nos sentidos da Docência no Brasil nos últimos anos.

 

 

IV - Reflexões pessoais sobre a docência

 

Após três anos de atuação do Programa junto ao Colégio Estadual Raul Vidal, observo a ratificação das vocações para a licenciatura dos envolvidos no projeto e a busca incansável por uma Educação de melhor qualidade em nosso país. Convivemos com as contradições que existem na sociedade brasileira e que se refletem no ambiente escolar.

. Amadureci, ao longo desse tempo, e voltei a sentir o quão gratificante é trabalhar com Educação. O interesse pelos desafios que sala de aula proporcionam não se traduzem mais em simples obstáculos. Estar no CE Raul Vidal desenvolvendo tais atividades me faz exercer com mais propriedade e intimidade o meu ofício, visto que, os laços que construímos com alunos e professores de outras disciplinas, com a coordenação, com a direção e a equipe que funciona no corpo escolar foram cultivados e agora frutificam.

Encontro, hoje, alunos mais interessados em debater, trazendo discussões e posicionamentos que provocam a problematização de conceitos, fontes de jornais e revistas, matérias televisivas e da internet.

É extremamente gratificante perceber que todo este trabalho gerou, e ainda gera, questionamentos e novas visões de mundo, que sem dúvida nenhuma dialogam e influenciam visões de mundo dos licenciandos e a minha própria.
Tal percepção proporcionou novos aprendizados, sendo eles de cunho ético, de respeito a minorias, de combate a preconceitos e luta contra as injustiças sociais, sempre de forma dialógica com os alunos.

Reitero que as aulas de História, assim como quaisquer outras, não devem estar centradas somente no professor. Nenhum professor é o supremo detentor do conhecimento, sem o qual não há aula. É todo um processo coletivo de construção do saber onde há impactos na vida dos professores (que se reinventam), do estudante (curioso, crítico e participativo), dos licenciandos (que descobrem as sutilezas escolares) e da comunidade, que se move impulsionada a partir da perspectiva de ter uma educação que realmente transforme a nossa sociedade.

Dificuldades sempre vão existir. Não me cabe julgar o descontentamento de alguns colegas e nem criticar, sem reflexão, aqueles que não conseguem se renovar e acabam por ficar na frustração, afinal o magistério também é um lugar das incertezas.

Mas, justamente por acreditar que a sala de aula é um local de militância pela Educação, entendo ser o nosso dever mostrar aos alunos que a construção do saber e a transformação de nossa realidade se faz porque são peça fundamental nesse processo e porque a construção do conhecimento não se faz sem eles. Aliás, não se faz sem a cooperação de TODOS os agentes envolvidos: alunos, professores, licenciandos, comunidade e universidade.

Nesse sentido, o PIBID vem cumprindo o difícil papel de ser um elo entre a Universidade e a Educação Básica, transformando a educação pública brasileira.

Bibliografia:

 

NÓVOA, António; Gandin, Luís Armando; Icle, Gilberto; Farenza, Nalú; Moschen Rickes, Simone. Pesquisa em Educação como Processo Dinâmico, Aberto e Imaginativo: uma entrevista com António Nóvoa. Educação & Realidade, vol. 36, n. 2, maio-agosto, 2011.

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Trad. de Francisco Pereira. Petrópolis: Vozes, 2002.

 

1 Este projeto constituiu-se no cerne do grupo de trabalho do PEA (UFRJ) e do qual convergiram as atividades e os desdobramentos do projeto inicial através da atuação de bolsistas de Iniciação Científica, Aperfeiçoamento e Apoio Técnico. Contou com o apoio financeiro do CNPq e da CAPES.

2 AZEVEDO, Francisca L. N., DAYRELL, Eliane Garcindo, SCHIMIDT, Guilhermo Giucci. A Conquista do Novo Mundo: Fontes Documentais e Bibliográficas Relativas à América Hispânica. Rio de Janeiro, FUJB, 1991.

___________. A Conquista da América Espanhola: Antologia. Rio de Janeiro, FUJB, 1991.

3 Preparação de materiais diversos, como slides, produção de vídeos, listas de exercícios para o Observatório do Enem, seleção de filmes exibidos em sala de aula e visitas a museus e centros culturais, como o CCBB e o IPN. Também foram produzidos artigos científicos publicados e/ou aguardando publicação.

4 Samora Machel foi tido como herói pelo povo moçambicano.

5 ALMEIDA, J. R.; ANDRADE, E.P.; CABECEIRAS, M. R. V; DEZEMONE, M. A. O. (ORG.). Universidade e escola formando professores de História. 1 ed. São Paulo: Letra e Voz, 2015.

6 ASSIS, Sulyanne Marques. Corpos em manifesto - gênero, sexualidade e “normalidade” heterossexual na escola. Niterói, 2016.

BRAGA, Raphael. Quem disse que professor não é pintor?. Niterói, 2016.

GONZAGA, Klauder V. Quevedo. Da prática discente à prática docente: Contribuição do PIBID para a formação profissional. Um breve relato. Niterói, 2016.

ROCHA, Marina Araújo. Reflexões sobre a prática do PIBIB no Colégio Estadual Raul Vidal. Niterói, 2016.

 

 

 

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